Quando percorremos um caminho sinuoso pela primeira vez há uma demora que parece sempre maior à ida do que à vinda. E aqui estava uma família de dois adultos e três crianças a meter-se à estrada.
– Primeiro ficámos em Cascais, um par de dias. Depois um mês na Costa da Caparica. Começámos a tratar dos papéis da residência. O meu marido conheceu uma pessoa que lhe disse que podia ajudar, disse que tínhamos de pagar 400 euros à Junta de Freguesia, eu disse ao meu marido que era melhor não termos intermediários, que devia ser ele a ir diretamente à Junta. E ao balcão, ele teve de pagar apenas 5 euros. Há quem esteja pronto para tirar partido dos que acabaram de chegar…
No fim desse mês, mudaram-se para o Laranjeiro.
– Um amigo do meu marido tinha-lhe dito que havia uma comunidade muçulmana no Laranjeiro, e preparámo-nos finalmente para alugar uma casa aqui. Ainda tivemos alguns contratempos com os valores de arrendamento que nos apresentaram, até entrarmos num apartamento que, apesar de caro, tinha boas condições. Pensámos que íamos conseguir um emprego facilmente, e avançámos. Um mês passado e a pandemia suspendeu o mundo. Tudo parou e nós não podíamos sair para ir procurar trabalho. «Quem pagará a renda?». Foi muito difícil, mas sobrevivemos.
É em alturas como esta que eu tento imaginar o que se passa na cabeça de um vencedor. Só damos importância ao alpinista quando ele alcança o topo da montanha, mas ele teve de ultrapassar inúmeros obstáculos ao longo do caminho. Digo isto ao meu marido, porque temos de perseverar para alcançar os nossos objetivos e concretizar o nosso destino.
Retrato de família – No primeiro mês em Almada, na Costa da Caparica
Os apoios sociais a que conseguiram ter acesso foram importantes para manter a panela ao lume.
– Tivemos de ultrapassar a pandemia com pouco dinheiro e acesso limitado a comida. A partir dos alimentos que recebíamos do Banco Alimentar tinha de ser inteligente na gestão e criativa na escolha das refeições a cozinhar, de maneira a não comprometer a saúde da minha família, antes vê-los satisfeitos e evitar que os meus filhos me dissessem que eu estava sempre a cozinhar a mesma coisa.
A família ao seu redor é um alento, ajuda a renovar o ar nos pulmões e impede que o sorriso se desmanche.
– Nos primeiros meses aqui lembro-me de o meu filho mais novo dizer, enquanto observávamos o céu à noite: «Como é que aquela grande estrela que costumávamos ver no céu da Índia também veio até aqui, até ao céu de Almada?»