Henrique Gomes nasceu na Charneca. Com onze anos caminhava todas as manhãs pelos caminhos de terra batida da Charneca à Fonte da Telha para entregar as encomendas, pão, frutas, e outras. Desse dia, ficava encomendado para o dia seguinte, e tudo se voltava a repetir. Aos doze anos era independente e tomava consciência para si: “Uma pessoa sem dinheiro não se safa.” Trabalhava numa mercearia, onde as pessoas compravam cinco tostões de pimenta, outro tanto de massa, manteiga pesada e cortada para recipiente, legumes secos que vendia a peso de sacos bem arregaçados como ainda hoje gosta de ter. Durante vinte e dois anos viu as irmãs saírem de manhã a pé a caminho da fábrica da cortiça na Cova da Piedade, iam em grupo, era uma paródia.
Há 68 anos arrancou com a sua mercearia. Foi número um em comércio pequeno no distrito de Setúbal. Em 1980 a mercearia passou a supermercado, e daí o atual nome. No pouco tempo livre ia aos bailaricos no clube recreativo charnequense. Como se pagava entrada, não fumava nem bebia para não gastar mais dinheiro.
A alimentação era feita de meia dúzia de coisas: conta que a sua bisavó só comia feijão, batatas e pão. Morreu aos 96 anos. Vivia-se literalmente do que a terra dava e por consequência trabalhava-se de sol a sol, a Charneca eram só áreas de cultivo, muito trabalho no campo. “Agora não há quem cuide.”