“Em 1959 trabalhavam aqui sete barbeiros, um engraxador e uma manicura.” José recebia 120 escudos à semana, trabalhava doze horas por dia, quinze horas ao sábado, e nem a hora de almoço gozava completa, a pensar nas gorjetas que podia fazer. “A clientela era muita.” Ao final do dia ainda se apressava a caminho da Amora para ir ajudar na barbearia do pai.
A carreira subia de Cacilhas para Almada cheia de operários de fato-macaco, da Lisnave. Cinco tostões até ao mercado, um escudo até ao Cristo Rei. Tudo saía no mercado, iam às suas vidas, muitos aproveitavam para ir ao barbeiro. Ao fim-de-semana havia também muita gente que se arranjava para ir aos bailaricos de sábado ou para os passeios de domingo. Havia quem estivesse na Incrível Almadense, em convívio, e no intervalo se escapasse para ir pôr perfume ou retocar a brilhantina à barbearia. Logo que José juntasse vinte escudos já podia ir dar um passeio a Lisboa. Dizia aos pais que ia ver uma revista ao Parque Mayer. Umas vezes ia mesmo, outras não, e divertia-se noutras andanças. Por vezes combinava com os amigos irem aos bailes da Moita, e eles passavam na barbearia com uma furgoneta a apanhá-lo.
José mexe o pente com destreza e fica no ar o som da tesoura pequena e afiada. Continua a dedicar toda a atenção e cuidado a cada pessoa que se senta nas cadeiras estofadas do seu estabelecimento. “Barbeiro não é profissão ou arte para enriquecer. Quando há trabalho vai-se desafogando, sem trabalho afunda-se.” Certo é que desde o dia 14 de Fevereiro de 1959 José se dedica diariamente. “Nunca fiz outra coisa.”